Into The Wilde - "A sociedade é uma coisa louca"
É preciso ter um espírito livre e mente aberta pra entender os processos do andarilho Alexander Supertramp no filme “Into The Wild” (2007). O conflito com os pais, as crises existenciais, as dúvidas de um jovem recém-saído do sistema educacional - que imerso numa sociedade feita de aparências e exigências de padrões, nos remete ao processo de inseguranças, incertezas e o sentimento de não pertencimento, vivenciados no início da fase adulta.
Durante sua jornada até o Alasca, os livros foram companheiros nos momentos de solitude e reflexões sobre possíveis caminhos a serem percorridos durante as andanças da vida e sobre formas de sobrevivência na natureza selvagem.
A frase de Lord Byron "não que ame menos o homem, mas
amo mais a natureza", no início do filme, nos remete a refletir sobre o quanto a humanidade
vem perdendo as conexões com os seus processos mais ancestrais e primitivos.
Para quem vivencia as experiências seja contemplando uma flor, uma árvore, um
pássaro, um pôr do sol, seja pisando na grama, na areia da praia, dando um mergulho
no mar, surfando uma onda, nadando num rio, entre outras inúmeras experiências
em nosso cotidiano ou estando em meio à natureza selvagem como fez o jovem
Alex, pode compreender essa sensação de plenitude, liberdade e um sentimento de
pertencimento ao universo.
O andarilho Supertramp inicia sua caminhada na busca de si, mas ao mesmo tempo na fuga de si, numa tentativa de se afastar dos pais e das dores vivenciadas na infância e adolescência. Trata-se de um processo mais comum do que imaginamos em nosso desenvolvimento como seres autônomos. Na busca pela nossa identidade, tentamos nos afastar do nosso espelho refletido pelos nossos genitores, como uma forma de conhecermos e identificarmos nossas subjetividades e processos do inconsciente. O caminho é de cada um e não existe atalhos para isso.
Dentre os encontros do andarilho até o Alasca, vamos compartilhando toda emoção e sentimento genuíno despertado nessas trocas, seja para o Alex, seja para quem cruza o seu caminho. O casal hippie (Rayne e Jan) que o acolhe e partilha amor e acolhimento, se referindo ao que podemos considerar como "núcleo familiar". O Wayne, com quem ele projeta a figura paterna de cuidado, de estímulo, de apoio e de conselhos sobre a vida e os perigos de ser tão radical em relação à sociedade. O sábio Joan, de quem ele recebe afeto, cuidado e uma troca genuína sobre o quanto amar e perdoar nutre nossa alma de força divina. Há uma troca geracional incrível nessa experiência quando Alex provoca Joan com a frase “as novas experiências são tudo para o espírito de um homem”.
A cada despedida, Alex leva e deixa um pouco das suas vivências, amor, carinho, respeito e o sentimento de coragem e determinação em construir seu próprio
caminho, mirando a “linha de chegada”, o Alasca, mas se permitindo fluir nesse
caminho, aproveitando cada momento.
Numa jornada marcada tanto pela emoção, quanto pela razão,
Alex segue em busca da paz interior. A cena dele descendo a correnteza do
rio, em meio à força das águas, num equilíbrio em meio ao caos, até a chegada
nas superfície mais calma, nos tira o fôlego e ao mesmo tempo nos seduz. Ao
vivenciarmos emoções em meio à natureza, podemos
nos identificar com a frase “se admitirmos que a vida humana pode ser regida
pela razão, está destruída a possibilidade da vida”. O que de fato é a nossa
existência se não for guiada pelas nossas emoções e experiências que nos
desperte os mais profundos sentimentos de plenitude?
A jornada do jovem Alex, que durou aproximadamente dois
anos, passa pelos estágios do nascimento; adolescência; idade adulta; família e
tornar-se sábio. Durante a caminhada e no seu processo de amadurecimento, o
andarilho compreende que “liberdade e beleza natural são boas demais para
recusar”. Ao se permitir uma pausa e se aproximar novamente da sociedade
"civilizada", ele tem as piores experiências e se dá conta
definitivamente que a “sociedade é uma coisa louca”.
A chegada ao Alasca e a descoberta do ônibus mágico,
significou vivenciar de fato a tal liberdade em meio à natureza selvagem tão
desejada. Ele coloca em prática os aprendizados adquiridos no caminho e se
permite mergulhar a fundo no seu processo de autoconhecimento e na
(re)descoberta de si. As leituras e as escritas o acompanham nos momentos de
solitude, paz, imersão e também nos momentos de solidão, medo e
inseguranças.
Passado o período de imersão, era hora de iniciar a jornada de “volta”, em sua nova fase, após tornar-se sábio. Eis que os caminhos mudaram, a trilha se modificou, a paisagem se alterou na natureza selvagem e o rio retomou seu espaço, com sua força e potência com a chegada da primavera. O jovem Alex que tanto buscou pela liberdade, foi aprisionado pela própria natureza.
Podemos
refletir sobre tal situação como uma metáfora da nossa vida, pois às vezes
estamos tão determinados em nos transformar e achar novos caminhos que não nos
damos conta de que não existe linha de partida e de chegada e sim o caminho em
si. Muitas vezes nos aprisionamos em nossas próprias trilhas, pensamentos,
traumas e vivências que deixamos de contemplar a jornada, esquecemos de nos
acolher com mais paciência, amor e gentileza.
Nos passos finais da jornada, o jovem Supertramp se permite reconhecer que a felicidade (acrescento aqui também o amor) só é de verdade quando compartilhados. Num momento de devaneios causados pela exaustão e pela fome, ele se perde na semelhança das folhas da batata roots.
Muitas vezes em
meio ao desespero, fazemos escolhas e tomamos decisões que nos levam a
confundir emoções e sentimentos. Numa busca constante de entender nossos processos e a busca pela tal liberdade e felicidade, podemos nos esquecer que
elas possuem vários nomes e significados, assim como as plantas selvagens.
Podemos considerar que encontramos a verdadeira felicidade e liberdade, mas e
se estivermos enganados pela semelhança das folhas e sementes?
Não existe uma fórmula capaz de dar conta de toda a
complexidade da nossa existência, mas penso que paz, tranquilidade, viver cada
momento e estar presente e atento para que possamos chamar cada coisa que
consideramos essencial e importante pelo seu nome correto, pelo seu
nome correto!
Que o espírito andarilho possa permanecer vivo em
cada um de nós!
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